segunda-feira, 29 de outubro de 2012

Uma análise da derrota do PT nas eleições em Fortaleza em 2012

Em que pese que o pathos da derrota ainda é recente e que existem muitas variáveis a serem analisadas, mesmo assim, mesmo ainda no calor dos acontecimentos, tentarei ser o mais objetivo que eu puder nesta análise. O fato que urge ser compreendido e contextualizado é a derrota de Elmano de Freitas nas urnas na capital Alencarina após tantas e tais vitórias significativas do PT e seus aliados na política cearense.

Acredito que Elmano cumpriu bem o seu papel, e que não contribui para esclarecer os fatos ficar se perguntando se os resultados seriam outros se qualquer outro nome tivesse sido escolhido, não existe “e se” em história e esse procedimento heurístico seria absolutamente improdutivo. O que temos diante de nós é a derrota nas urnas de Elmano de Freitas batido por Roberto Cláudio. Há uma sutil inflexão em se perguntar pela derrota de Elmano ou pelos fatores que levaram Roberto Cláudio a vitória, certamente entre as respostas para as duas perguntas existem elementos comuns, mas são perguntas com respostas e consequências diferentes e, no momento, só possuo elementos para tentar começar a responder por que Elmano de Freitas perdeu, ou melhor, quais as razões do fracasso petista na capital.

Há uma série de equívocos que se acumularam desde antes do início da eleição propriamente dita, e creio que dois foram os mais graves. O primeiro foi a escolha do sucessor de Luiziane feita com tão pouca antecedência. A figura de Elmano, ou mesmo a estratégia para a sucessão, deveria ter sido pensada com uma antecedência muito maior, para que não parecesse às pessoas de fora do partido, algo tão artificial. É provável que a psicologia desse erro tenha influenciado ou sido similar a dos outros erros cometidos que explicam essa derrota. O outro erro fundamental foi ter subestimado Cid Ferreira Gomes, esse foi um erro grosseiro, que em parte possui parentesco com o erro que apontei anteriormente, pois em ambos pode-se perceber que há um sentimento de hybris, de desmedida e arrogância que leva fatalmente a uma compreensão equivocada da realidade. Se é que há algo que aprendemos nessas eleições foi a não subestimar Cid Ferreira Gomes e nem a força do poder econômico. Creio que há mais de cem anos, nosso estado não vê um político amealhar tamanho poder quanto Cid possui hodiernamente.

Um sinal de alerta que não foi percebido pelos estrategistas da campanha foi o fraco desempenho de nossos vereadores, cujas votações ficaram muita aquém da expectativa que existia e mesmo o número de vereadores eleitos, apenas quatro, quando pensávamos em eleger seis, talvez quiçá sete! A campanha proporcional, assim me parece, é algo que precisa ser pensado com cuidado para se compreender a nossa derrota. Pelo menos nesse primeiro momento eu acredito que a maioria dos candidatos a vereador se preocupou mais com as próprias campanhas do que com a campanha majoritária. Os motivos disso merecem maior reflexão, ou mesmo se se trata de fato ou hipótese apenas.

Passando a fatos mais concretos, o PT estava dividido, uma boa parte do nosso partido esteve e está no bolso de Cid, e uma outra parte, ainda tinha na boca o gosto amargo de ter tido seus representantes preteridos como candidatos a prefeito no lugar de Elmano. Francisco Pinheiro, Camilo Santana e Nelson Martins tiveram uma participação apenas “estética” na campanha de Elmano, assim como seus respectivos grupos. Poder-se-ia contrapor a isso que o PSB também estava dividido, que os Novais estavam contra os Ferreiras Gomes, bem como os militantes históricos do PSB, bem, essa divisão em nada enfraqueceu Cid e Roberto Cláudio, tendo sido no máximo um incômodo. Cid e seus irmãos são antes de tudo um grupo familiar, que se utilizam do PSB. Algo muito diferente da organicidade de PT e de seus membros, o que apenas demonstra a habilidade política de Cid ao cooptar membros históricos do partido como Pinheiro e Nelson (Camilo não possui raízes profundas no partido e possui relações mais estreitas com os Ferreiras Gomes do que com o PT).

Nós superestimamos o poder de Lula e sua transferência de votos. O ex-presidente sempre foi a proverbial “carta na manga”, o grande trunfo, mas como se viu, e contra fatos não há argumentos, o carisma e o poder de convencimento de Lula, sozinhos, não bastaram para bater Cid Gomes. Assim como utilizamos a imagem de Lula, associando Elmano a Lula, Roberto Cláudio utilizou a imagem de Cid, com muito maior sucesso. Nesse ponto, nossa avaliação exagerada passou igualmente por uma subavaliação do poder e popularidade de Cid e Ciro (que se fez muito presente nesse pleito). Isso não significa que a participação de Lula tenha sido sem importância, pelo contrário, foi algo da máxima importância. Todavia, a participação dele em nossa campanha foi bem menor do que se viu em São Paulo, ele esteve em Fortaleza no segundo turno, mas por poucas horas, e ainda com a saúde abalada pelo tratamento exitoso contra o câncer. Além disso, a ausência de Dilma, que não passava de uma fotografia nos materiais impressos, pesou muito negativamente. De mãos atadas pela vasta base de sustentação ao seu governo (praticamente todos os partidos importantes que disputaram esse pleito, incluindo PSB, são de sua base aliada) teve que se manter silenciosa e neutra. Todavia sua neutralidade de neutra tinha pouca coisa, afinal ela é do Partido dos Trabalhadores e seu silêncio pesava sobre nós e fortalecia Roberto Cláudio, que com razão, a citava frequentemente. O PSB não rompera nacionalmente com o PT, tão pouco, no resto do estado, estavam rompidos, apenas na capital existia esse rompimento. Outro elemento que superestimanos foi a força da aguerrida militância petista. Sem a devida organização, estando dividida e muitas vezes desmotivada e sem o apoio de seus líderes partidários, a militância não alterou significativamente o fiel dessa balança tão desigual.

Finalmente, não poderíamos deixar de notar um fato crucial, existiu nessas eleições um poderoso sentimento anti-petista como não se via há tempos. Houve enormes manifestações de apoio a Roberto Cláudio, principalmente por membros da classe média e por membros das classes mais abastadas, coisa que em 18 anos de militância eu jamais presenciara. Boa parte desse entusiasmo e apoio não era propriamente apoio a Roberto Claudio, mas repúdio ao PT e a Luizianne Lins. A imprensa criou para a prefeita de Fortaleza uma imagem das mais negativas, imagem essa que ela ajudou a forjar. Sua infeliz declaração de que estava preparada para eleger até mesmo um poste quebrado deu a nossos oponentes de presente um slogan, e mais munição contra o PT, além disso, a frase intempestiva revela um flagrante desrespeito pelo poder da opinião pública e há um inegável traço de arrogância e jactância. A projeção negativa coletiva precisa de um gancho projetivo para se estabelecer, e Luizianne forneceu esse gancho. Certamente existiu um grau elevado de manipulação da mídia nesse caso, principalmente na percepção do valor de sua gestão – justiça seja feita bem melhor e mais competente do que foi mostrado pela imprensa – mas parece-me que o poder desse imaginário não foi levado em conta em nossa estratégia. A briga pública pela mídia com Cid e Ciro foi desnecessária e deselegante, e certamente ajudou a cimentar ainda mais essa percepção negativa sobre a personalidade dela e sobre a gestão. A mim me impressiona que, em São Paulo o PT tenha sido vitorioso e que em Fortaleza tenhamos perdido e me impressiona ainda mais o sentimento anti-petista, que mesmo as conquistas na esfera federal não puderam abafar. Se há uma lição a ser aprendida aqui – e creio que há muitas – é que não há nada mais atual do que a luta de classes e a reificação, e que Zizek está coberto de razão, Marx ainda é um instrumento indispensável para compreender a realidade.

No fim das contas o poder econômico foi o fator que desequilibrou a balança, na reta final foi como dizem os americanos “money talks”, e isso foi outro fator que não levamos em conta. Confúcio dizia que existem 3 maneiras de se aprender: a mais fácil é pelo exemplo, a mais nobre pela reflexão e a mais amarga pela experiência. Essa mestra severa, a derrota, pode nos ensinar muito, como intelectual de esquerda é meu dever de ofício analisar essas lições e tentar garantir que mais pessoas possam aprender com essa experiência tão amarga. Nesse pleito, com a prefeitura em nossas mãos, fomos batidos, em 2014 Cid terá em seu poder o estado e a prefeitura de Fortaleza... Essa não exatamente uma perspectiva animadora. Certamente estamos vivendo o esgotamento de um modelo de política, e urge que pensemos outro, mas o mais grave, estaremos assistindo ao nascimento de um ciclo de poder como foi com Tasso Jereissate? Teremos talvez, mais uns vinte anos de oligarquia dos Ferreiras Gomes em nosso estado? Seriam os fogos de artifício no comitê central de Roberto Cláudio o choro de nascimento desse novo ciclo de poder capitaneado pela mão firme de Cid? Há muito o que se pensar, principalmente em qual vai ser o papel do PT nesse novo cenário que se desenha...

7 comentários:

  1. Serio? Porra, td culpa entao estah nas falhas taticas do PT? Duas linhas c/ eufemismo do 'poder economico' p/ caracterizar a ESCANDALOSA E DESCARADA COMPRA D VOTOS Q ROUBOU A ELEIÇAO? Acho q dormi e acordei num outro lugar q nao eh Fortaleza. Ou terah sido soh um pesadelo? Rafael Tomyama

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Rafael, como eu disse no texto, estou interessado em analisar, com os elementos que tenho a mão no momento (esta é uma primeira análise)a nossa derrota, e não os motivos que os levaram a vitória (a compra de votos foi um deles), sobre a compra de votos o que podemos fazer é denunciar a opinião pública e ao ministério público, mas sinceramente não espero grandes resultados disso. quanto as nossas falhas, essas sim podemos fazer algo a respeito. a compra de votos foi um fator importante, mas vc sabe, tão bem quanto eu, que não se ganha uma eleição majoritária com compra de votos, a despeito da maneira acintosa e do flagrante desrespeito pela lei, não creio (num primeiro momento) que isso baste para explicar a nossa derrota. Além disso, esse é o momento em que devemos repensar muitas coisas do nosso partido. creio sinceramente que se não tivéssemos errado tanto, a compra de votos e boca de urna deles não teria sido tão efetiva quanto foi, mas ainda é preciso que estudemos mais e analisemos mais detidamente as informações de que dispomos, como eu disse no começo, o pathos da derrota ainda é muito recente e todos estamos afetados por ele...

      Excluir
    2. Este comentário foi removido pelo autor.

      Excluir
    3. Amarelo-sujo S.A. (ou como a 4a. capital do país foi tomada de assalto por um golpe eleitoral) http://aeceara.blogspot.com.br/2012/11/amarelo-sujo-sa.html

      Excluir
  2. A derrota do poder municipal em Fortaleza chama-se, unicamente sem tirar nem por, Luizianne Lins!
    Assim como no primeiro mandato ganhou por sua teimosia (justíssima!), perde agora pela arrogância desmesurada; um horror!!! Cadê a Fortaleza Bela prometida; nem de longe nem de perto...
    Abs, do Pedro Wilson Tavarez.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Creio que Luizianne e suas declarações e temosia, como você mesmo aponta Pedro, foram fatores importantes para essa derrota. sua reflexão é interessante, pq alguns desses mesmos traços de personalidade de Luizianne foram justamente fatores importantes para que ela chegasse ao poder, mas me parece que existiu uma miopia que impediu a ela e a parte dos estrategistas da campanha de avaliar corretamente a realidade, talvez oriunda justamente de um sentimento injustificado de arrogância. Todavia, não sou dado a reducionismos, nossa derrota é um fato complexo com muitas causas, mas creio que a "psicologia" de nossa derrota foi sim a Hybris, a arrogância, que nos sirva de lição e a derrota faz parte do jogo democrático...

      Excluir
  3. Nunca pertenceu Newton, num regime democrático a cidade pertence ao povo, esse mesmo povo levou luiziane e o PT ao poder e o mesmíssimo povo a apeou do poder, "nunca mais" é muito tempo e, novamente, num regime democrático a alternância de poder é um fato normal, e o PT e seu projeto para a nação tem sido bem sucedido, como bem demonstram a popularidade e reconhecimento internacional de Lula e Dilma, mas apesar de não concordar, respeito a sua opinião e agradeço por expressá-la nesse espaço

    ResponderExcluir